O novo boletim do Dieese, divulgado na semana passada, mostra que o trabalho intermitente não criou novos postos de trabalho, nem reduziu o desemprego. Para piorar, boa parte desses contratos resultaram numa renda menor que um salário mínimo.
A modalidade do trabalho intermitente foi criada em 2017, pela “reforma” trabalhista do governo Michel Temer (MDB), caracterizada pela ausência de jornada fixa, sem a previsão de dias ou horas mínimas de trabalho. Para o diretor técnico do Dieese, Fausto Augusto Junior, o estudo notou ressaltou os pontos negativos para os trabalhadores inseridos nesse regime.
O boletim do Dieese lembra que os defensores da reforma alegavam que os contratos intermitentes poderiam gerar milhões de novos postos de trabalho. Porém, ao final de 2018, havia 62 mil vínculos intermitentes ativos. Em 2019, foram mais 168 mil vínculos intermitentes, dos quais 121 mil duraram pelo menos até o final do ano. Já os dados até outubro de 2020 indicam 210 mil vínculos intermitentes, o que corresponde a 0,44% do total de vínculos formais.
“As informações relacionadas ao emprego de 2019 mostram que, assim como ocorreu em 2018, muitos dos contratos passaram boa parte do ano engavetados, ou seja, geraram pouco ou nenhum trabalho e renda, e a renda gerada foi muito baixa“, aponta o boletim do Dieese.
Sem renda
Entre os vínculos admitidos em 2019, 22% não tiveram renda. Ou seja, um em cada cinco contratos intermitentes não gerou qualquer tipo de remuneração para o trabalhador. Esse resultado foi pior do que o registrado em 2018, quando 11% dos vínculos não tiveram renda.
Fausto lembra que o trabalho intermitente nasce para ocupar pontos específicos da produção, mas passa muita insegurança a quem o ocupa. “Essa modalidade de contrato intermitente vendida como uma nova modalidade de contratação, que geraria muitos postos de trabalho, mostrou que não faz isso e ainda cria muita instabilidade financeira, transformando-se num engodo para o trabalhador”, afirma, na participação do Dieese no Jornal Brasil Atual.
O especialista afirma que a modalidade estimula a precarização do emprego. “O contrato intermitente foi inspirado no contrato zero hora, da Inglaterra, que não garante uma jornada fixa de trabalho. De alguma forma, isso é a institucionalização e a legalização do ‘bico’”, acrescenta.
Segundo o boletim, para cada três meses de trabalho, os vínculos intermitentes ficaram outros três meses na gaveta. Ao final de 2019, a remuneração mensal média paga para cada vínculo intermitente foi de R$ 637 – contando os meses a partir da admissão, trabalhados ou não, valor equivalente a cerca de 64% do salário mínimo oficial. Houve piora em relação ao ano anterior: em 2018, a remuneração média dos vínculos intermitentes correspondia a 80% do valor do salário mínimo daquele ano.
STF julga trabalho intermitente
O Supremo Tribunal Federal (STF) debate a validade do contrato de trabalho intermitente. No dia 3 de dezembro, o julgamento a respeito do tema foi suspenso por pedido de vista da ministra Rosa Weber, quando o placar estava em dois votos a favor e um contrário a essa modalidade de contratação.
Os ministros Nunes Marques e Alexandre de Moraes votaram pela constitucionalidade do trabalho intermitente, enquanto o ministro Edson Fachin votou de forma contrária. O STF está julgando três ações de inconstitucionalidade contra o contrato intermitente, e não há prazo para o julgamento ser retomado.
Em seu voto, Fachin afirmou que o sistema intermitente traz “imprevisibilidade” ao não fixar previsão de remuneração mínima aos trabalhadores. “Com a situação de intermitência, instala-se a imprevisibilidade sobre um elemento essencial da relação trabalhista formal, ou seja, a remuneração pela prestação de serviço”, disse o ministro.
Fausto endossa a necessidade do debate sobre o julgamento, já que a inconstitucionalidade do trabalho intermitente pode frear outras “maldades” planejadas pelo ministro da Economia, Paulo Guedes. “Uma das defesas atuais do Guedes é a implementação do contrato por hora, ou seja, fracionar todas as formas de contratação por hora. Isso é bastante grave. Desde 2017, há um movimento para flexibilizar os contratos e direitos trabalhistas, atacando a renda e jornada. Querem precarizar e tirar a segurança financeira do trabalhador.”
Rede Brasil Atual